Agostinho da Silva
A folha pautada do bloco, ainda em branco, tem de ser preenchida.
Em plena “silly season”, a morrinha húmida que vai caindo transforma o ar numa sauna abafada, doentia. O dia cinzento não lembra o Verão e os pássaros, sempre tão esvoaçantes e ruidosos, andam nas bagas de folhado, nas amoras túrgidas precocemente adocicadas por este tempo quente. Pesa na atmosfera uma natureza adormecida…
Já a noite se enche de sons. Neste fim-de-semana toda a Ilha borbulha
e se agita, sacode e remexe, em eventos de Verão, sem horas nem tempo
que não seja o das férias, o da cerveja ou mesmo o do engate.
Engatados estarão os governos; o regional porque nem passou, em cem
dias, pelo estado de graça e o nacional porque não sai do estado da
desgraça. É também engate o assédio político e tendencioso dos
telejornais, debates, mesas redondas e afins. O tempo eleitoralista
promete horizontes risonhos, fartos, filhos de cofres cheios e pleno
emprego. Os pobres deixam essa qualidade e passam a remediados
temporários da ilusão, os desempregados dependem dos fundos europeus, da
falácia política, das estatísticas balanceadas e anedóticas.
Charlot dizia “Somos todos amadores. Não vivemos o suficiente para podermos ser outra coisa.” Grande lição!
Agosto depressa passará porque este ano “outros valores mais altos se
levantam” e adivinho que o tempo de descanso se converterá num tempo de
bravatas e liças de oratórias cheias de energia.
É capaz de encapotar mais um desaire, já iniciado, na colocação de
professores, fará esquecer que este governo tenciona gastar, dar do que é
de todos, cinquenta e três (53) milhões ao ensino privado, afogando
ainda mais a Escola Pública na qual prevalece a austeridade com redução
de estabelecimentos, de professores de ensino especial, aumento de
número de alunos por turma, falta dos mínimos exigíveis à eventual
higiene, constrangimentos de verbas nas cantinas que deveriam assegurar
refeições equilibradas e saudáveis, para além do espectro da dispensa do
pessoal dito excedente.
Da saúde temos as notícias nos casos do dia e da semana e apenas
refiro que li, hoje, que 15% das sete (7) milhões de receitas prescritas
não são levantadas nas farmácias. E quantas serão aviadas pela metade?
Na ética do país sucedem-se os casos, avolumam-se na enorme
secretária de um super juiz, vão alimentando capas de periódicos e
pasquins, notícias bombásticas na televisão. E seria este o tal período
de silly season…
Resta-me a esperança de que o povo não é insensível nem tapado e se o
oportunismo não for a mola poderosa das intenções, havemos de dar a
volta e ressurgir na estação mais bela do ano que é o Outono, porque
mais colorida e poética.
Maria Teresa Góis
Sem comentários:
Enviar um comentário