Em 1580, dois anos depois da catástrofe militar marroquina em que perdeu a vida, com milhares dos seus súbditos, o rei D. Sebastião de Portugal, a Espanha, encabeçada pelo rei Filipe II, anexou a Coroa lusitana.
Sessenta anos depois, no dia 1.º de Dezembro de 1640, um grupo de conjurados portugueses (Os Restauradores) assaltou, num audacioso golpe-de-mão, a residência da vice-rainha espanhola (Duquesa de Mântua), aprisionou-a e pôs termo ao longo domínio estrangeiro, colocando no trono, para início da 4.ª dinastia portuguesa, o Duque de Bragança (rei D. João IV).
A seguir se transcreve a forma como Mário Domingues, apoiando-se em Pinheiro Chagas, descreve os primeiros momentos dessa manhã de libertação.
A seguir se transcreve a forma como Mário Domingues, apoiando-se em Pinheiro Chagas, descreve os primeiros momentos dessa manhã de libertação.
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“A manhã de 1 de Dezembro de 1640, ao contrário do que costuma suceder nesta estação do ano, surgiu clara, sem nuvens no azul cetinoso do céu, permitindo que o Sol brilhasse tão vivamente como num dia de Agosto. Dir-se-ia um bom prenúncio para os que desejavam que esta data atingisse um brilho inextinguível na já tão acidentada história de Portugal.
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Consoante o plano estabelecido, manhã cedo, começaram a afluir ao Terreiro do Paço os revolucionários, em pequenos ranchos para não despertarem suspeitas, ocultando as armas debaixo das grandes capas em moda nesse tempo, nas quais se embuçavam como se apenas quisessem resguardar-se do frio.
Os fidalgos iniciados no segredo da conjura e os convidados de última hora apresentavam-se placidamente, em ar de descuidoso passeio, conforme Pinto Ribeiro lhes recomendara, o que não suscitou desconfianças, porque nessa época havia hábitos madrugadores e frequentemente apareciam muito cedo grupos no Terreiro do Paço, à espera de que as repartições abrissem a fim de tratarem de assuntos burocráticos.
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Duquesa de Mântua, vice-rainha espanhola
Alguns nobres vinham a cavalo, vulgar meio de transporte, outros de coche, dentro do qual ocultavam melhor as suas armas. Detinham-se aqui e além, com aspecto tranquilo, mas intimamente ansiosos por que soassem as nove horas para início da acção. Os minutos, porém, arrastavam-se com a lentidão de lesmas.
- “A aparência pacífica dos coches, que iam chegando ao Terreiro do Paço – descreve-nos Pinheiro Chagas, com o colorido que lhe é peculiar – não assustava os soldados da guarda, acostumados, nesses tempos mais madrugadores do que os nossos, a verem aparecer junto do palácio os cortesãos da duquesa. O povo também ainda não se acumulara em grande quantidade. Com a mão no fecho das portinholas, esperavam os fidalgos impacientes o bater da hora solene.
D. João IV, rei de Portugal.
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Dão nove horas.
Abrem-se a um tempo os coches e os fidalgos descem; e enquanto Jorge de Melo, Estêvão da Cunha, António de Melo e Castro, o padre Nicolau da Maia e outros esperam, ainda dentro das carruagens, que venha o sinal do palácio para assaltarem a guarda castelhana, o grosso dos conjurados sobe rapidamente as escadas, entra na sala dos archeiros tudescos e, sem lhes darem tempo nem sequer para suspeitarem do que ia suceder, Afonso de Menezes, Gaspar de Brito Freire e Marco António de Azevedo deitam ao chão os cabides das alabardas, outros, desembainhando as espadas, afugentam os archeiros atónitos e desarmados.
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Alguns destes, ou por não terem as alabardas nos cabides, ou por serem resolutos, cumpriram o seu dever com certa bravura, já defendendo a entrada do corredor que ia ter ao forte onde ficavam os quartos de Miguel de Vasconcelos, já cobrindo a porta dos aposentos da duquesa de Mântua.
Os primeiros levam-nos adiante de si Pedro de Mendonça e Tomé de Sousa, os outros resistem com desespero a Luís Godinho Benavente e mais três ou quatro fidalgos, e só fogem depois de terem visto cair dois dos seus, um morto, outro ferido.
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Monumento aos Restauradores - Lisboa - Portugal
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Entretanto, D. Miguel de Almeida, ébrio de alegria, corre a uma varanda, abre-a e, brandindo um estoque, exclamava:
Liberdade! Liberdade! Viva el-rei D. João IV! O duque de Bragança é nosso legítimo rei!
E as lágrimas, embargando-lhe a voz, inundavam-lhe as barbas alvejantes, que flutuavam ao sopro da brisa do Tejo, que douravam os raios do Sol a campear no céu.
Liberdade! Liberdade! Viva el-rei D. João IV! O duque de Bragança é nosso legítimo rei!
E as lágrimas, embargando-lhe a voz, inundavam-lhe as barbas alvejantes, que flutuavam ao sopro da brisa do Tejo, que douravam os raios do Sol a campear no céu.
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Respondeu-lhe de baixo um imenso grito de entusiasmo e júbilo:
Liberdade! Liberdade! – gritou o povo, num clamor uníssono.
É que todos julgavam divisar nesse heróico D. Miguel de Almeida, nesse velho de oitenta anos, radiante de ardor juvenil, o símbolo de Portugal decrépito e alquebrado, mas iluminado nessa hora de ressurreição por um lampejo, por um reflexo do esplendor das suas eras gloriosas”.
Respondeu-lhe de baixo um imenso grito de entusiasmo e júbilo:
Liberdade! Liberdade! – gritou o povo, num clamor uníssono.
É que todos julgavam divisar nesse heróico D. Miguel de Almeida, nesse velho de oitenta anos, radiante de ardor juvenil, o símbolo de Portugal decrépito e alquebrado, mas iluminado nessa hora de ressurreição por um lampejo, por um reflexo do esplendor das suas eras gloriosas”.
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Nota
Mário Domingues - A Revolução de 1640 - Editado por Livraria Romano Torres - Lisboa - 1970
Como estaríamos se fôssemos uma província espanhola?
ResponderEliminarNeste post, há um pormenor que me chamou a atenção: O banco de jardim com um painel de azulejos alusivo à restauração da soberania portuguesa. Tenho uma fotografia com quarenta anos, onde estou sentado nele com a minha consorte, estávamos em lua-de-mel.
Domingos. Viva, já agora, se aqui voltar, poderia localizar o banco em azulejo? Era uma achega.Propício a namoro espero que continuem namorando vida fora. Obrigada, abraço.
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