[google6450332ca0b2b225.html

quarta-feira, novembro 30, 2011

Kseniya Simonova

Kseniya Simonova foi a vencedora da edição Ucraniana do Got Talent.
Na final, ao vivo, fez uma animação da invasão da alemanha na Ucrânia durante a Segunda Guerra Mundial, tendo usado os dedos e uma superfície com areia.
Trouxe lágrimas aos olhos de juízes e do público.
Foram 8 minutos maravilhosos que demonstraram um talento especial e trouxeram, através da arte, a memória viva de uma guerra que marcou várias gerações. 

terça-feira, novembro 29, 2011

29 DE NOVEMBRO - DIA INTERNACIONAL DE SOLIDARIEDADE AO POVO PALESTINO

RESOLUÇÃO 32/40 DA ONU

"Em 1977, a Assembleia Geral do ONU determinou que fosse celebrado, todos os anos, a 29 de Novembro (resolução 32/40 B) um Dia Internacional de Solidariedade para com o Povo Palestino.

Com efeito, foi nesse dia que, no ano de 1947, que a Assembleia Geral aprovou a resolução sobre a divisão da Palestina [resolução 181 (II)].

A 3 de Dezembro de 2001, a Assembleia tomou nota das medidas adoptadas pelos Estados Membros para celebrar o dia e pediu-lhes que continuassem a dar a essa manifestação a maior publicidade possível (resolução 56/34).

Reafirmando que as Nações Unidas têm uma responsabilidade permanente no que se refere à questão da Palestina, até que se resolva satisfatoriamente, no respeito pela legitimidade internacional, a Assembleia autorizou, a 3 de Dezembro de 2001, o Comité para o Exercício dos Direitos Inalienáveis do Povo Palestino a continuar a promover o exercício de tais direitos, a adaptar o seu programa de trabalho em função dos acontecimentos e a insistir na necessidade de mobilizar a ajuda e o apoio ao povo palestino (resolução 56/33).

Foi solicitado ao Comité que continuasse a cooperar com as organizações da sociedade civil Palestina e outras, a fim de mobilizar o apoio da comunidade internacional a favor da realização, por parte do povo palestino, dos seus direitos inalienáveis e de uma solução pacífica para a questão da Palestina, e que envolvesse mais organizações da sociedade civil no seu trabalho.

Em 1947 a ONU era integrada por 57 países e o ambiente político era completamente dominado pelos EUA, que fizeram pressão sobre as pequenas nações. Com 25 votos a favor, 13 contra e 17 abstenções e, sem o consentimento dos legítimos donos da terra - o povo palestino, foi decidida a divisão da Palestina.

A resolução de nº. 181, determinou a divisão da Palestina em dois Estados: o Palestino e o de  Israel

Na partilha do território, 56% da área caberia aos israelitas que, na fundação de seu Estado, ocuparam 78% do espaço e se valeram da força para promover a expulsão dos palestinos de seus lares e terras - que se refugiaram em acampamentos na Cisjordânia, Gaza, Líbano, Jordânia e Síria.

Em 1967, Israel ocupou o restante do território que a divisão da ONU destinara à construção do Estado Palestino.

A efectivação do Estado Palestino independente, com Capital Jerusalém e o retorno dos refugiados (Resolução 194 da ONU) são questões cruciais à construção de uma paz verdadeira no Oriente Médio, que precisa ser justa e respeitada para ser duradoura."
in: Blog do Amigo Carlinhos Medeiros, "Bodega Cultural".

Abreviaturas nos SMS altera processamento de linguagem

A utilização de abreviaturas e símbolos nas mensagens de texto enviadas por telemóvel (SMS) ou Internet pode alterar a forma de processar do cérebro, modificando a própria linguagem, defendeu, em entrevista à Lusa, o neuropsicólogo Michael Corballis.
Para o neuropsicólogo neozelandês, que está hoje em Portugal para participar na conferência "A Origem da Linguagem", as mudanças acontecerão "em pequenas doses".
"Os novos media [textos de SMS ou na Internet] podem alterar a linguagem em pequenas doses. Por exemplo, nos SMS, as pessoas usam abreviaturas e símbolos que podem ter pequenos efeitos na forma como o cérebro processa a linguagem".
Apesar desta evolução ser natural até porque "a linguagem está continuamente a mudar e a diversificar-se", Michael Corballis duvida que o futuro traga uma língua universal.
"Existem hoje em dia mais de 6.000 línguas no mundo, o que torna muito pouco provável a existência de uma linguagem universal", afirmou.
Embora reconheça que as rádios, televisões e Internet proporcionem uma "maior universalidade", o cientista lembrou que "as pessoas tendem naturalmente a defender a sua língua e a preservar as diferenças".

segunda-feira, novembro 28, 2011

EQUINÓCIO

Chega-se a este ponto em que se fica à espera
Em que apetece um ombro o pano de um teatro
um passeio de noite a sós de bicicleta
o riso que ninguém reteve num retrato

Folheia-se num bar o horário da Morte
Encomenda-se um gim enquanto ela não chega
Loucura foi não ter incendiado o bosque
Já não sei em que mês se deu aquela cena

Chega-se a este ponto Arrepiar caminho
Soletrar no passado a imagem do futuro
Abrir uma janela Acender o cachimbo
para deixar no mundo uma herança de fumo

Rola mais um trovão Chega-se a este ponto
em que apetece um ombro e nos pedem um sabre
Em que a rota do Sol é a roda do sono
Chega-se a este ponto em que a gente não sabe


(de Do Tempo ao Coração, 1966) 

David Mourão-Ferreira

sábado, novembro 26, 2011

olho o côncavo azul

                                                                                  
Olho o côncavo azul do firmamento
é tarde
um sobretudo agita-se para os lados de alcântara

Felizes os que morreram canta um sino
e com certo compasso certa razão se se pensa
na quantidade de espaço ocupado
pelos que sopram coisas há séculos debaixo de terra
os que vêm aqui fazer eternidade grandes ovas do espírito
e não levam para lá coisa nenhuma
nem um pequeno vaso uma estatueta de bolso
um balão de criança que é tão leve
nada
porque o lá não existe lá, nós que carreguemos
as mil missas em ré do bicho-de-conta
as quinhentas pinturas do mão já nenhuma
o bilião de palavras do caveira três
e mais os planetas desertos, que também mandam coisas

Felizes os que morreram realmente ó sino
mas mais felizes ainda os que mataram
mais felizes os que ergueram à altura simples do corpo punhal
fundente
as molas sete e oito da grande máquina
e a quebraram nos ossos do espectáculo
porque ele é a usura
da noite de cavalos submergidos no lago
a estrada contra-curva
onde Harcamone passa a caminho do teatro
a uma mesa de mortos galvanizados

Porque a poesia não é para galvanizar isso
a poesia a poesia
o recôncavo azul do firmamento
que é negro
e outras coisas mais
se ainda é tempo de ver por cima do prato
os vigia os paloma os clandestinos os lâmpara
os invisíveis anjos guardadores
do trabalho que não pode ser adiado
e não esta linguagem de lamento esta linha de rogo que frustra a voz
não este verso exposto a mil vagares na almofada branca de uma página
mil vezes decapitada na praça pública
em oitavas e quartas paralelas e sétimas dominantes cheias de horror
e ainda assim contentes
de bailarem em torno do seu próprio círculo
mas o que na manhã só uma vez quase ouvimos
um para o outro
um dentro do outro
mais interiores à magnificência da espécie
do que aos espaçosos e nobres labirintos do canto

Mário Cesariny
(9/8/1923-26/11/2006)

quadro do autor, 1960                               

sexta-feira, novembro 25, 2011

a violência mata!


Tintoretto

Auto-retrato - Tintoretto
Museu do Estado, Assunção, Paraguai 
 
 
TINTORETTO
(JACOPO ROBUSTTI)
 

Tintoretto,  como era conhecido Jacopo Robustti (Veneza  c. 1518 - 1594), foi provavelmente o último grande pintor da Renascença Italiana.  Por sua energia fenomenal em pintar, foi chamado Il Furioso, e sua dramática utilização da perspectiva e dos efeitos da luz fez dele um dos precursores do Barroco.  Seu pai, Battista Robustti, era tintore (tingia seda), o que lhe valeu o apelido.
Na infância, Jacopo, um pintor nato, começou a decorar as paredes da tinturaria paterna. Vendo seu talento, seu pai levou-o à oficina de Tiziano,  na época com mais de cinquenta anos, para aprender o ofício . Dizem que o mestre ficou pouco tempo com ele, por ter percebido o talento e a independência do menino, o que faria dele um pintor, mas não um bom aprendiz. Tintoretto estudou então por conta própria, observando as obras dos grandes mestres. Mas continuou admirador, nunca um amigo de Ticiano, e mais tarde adotou como lema em seu estúdio a frase "O desenho de Michelangelo e a cor de Ticiano" .
Tintoretto começou ajudando o pintor Schiavone, seu amigo, a decorar paredes. Na sequência conseguiu encomendas para si mesmo. Seus dois primeiros trabalhos foram murais descritos como "A Festa de Balthasar" e "Carga de Cavalaria".  Seu primeiro trabalho a ter repercussão foi um retrato dele e seu irmão com um efeito noturno, infelizmente perdido, como os dois anteriores. Uma das pinturas iniciais ainda existentes está na igreja de Carmine, em Veneza: a "Apresentação de Jesus no Templo". Em São Benedito estão "A Anunciação" e "Cristo e a Mulher de Samaria". Para a Escola da Trindade ( na verdade um hospital e asilo em Veneza ) ele pintou quatro passagens do Gênesis.  Duas delas, "Adão e Eva" e "Morte de Abel", atualmente na Academia Veneziana, mostram um trabalho nobre de alta mestria, que não deixam dúvidas de que Tintoretto nessa época já era um pintor consumado, um dos poucos que conseguiram reconhecimento sem um aprendizado formal.
Durante o ano de 1546, Tintoretto pintou para a igreja da Madona do Horto três de seus melhores trabalhos, "A Confecção do Calf Dourado", "Apresentação da Virgem no Templo" e "Ultimo Julgamento"  ( vergonhosamente repintada ). Esta igreja em estilo gótico  em Fondamenta dei Mori, próxima a Murano, Veneza,  existe ainda. Em 1548 recebeu a encomenda de quatro quadros para a Escola de São Marcos,  "Encontrando o Corpo de São Marcos em Alexandria" (atualmente em Murano), "O corpo do Santo trazido    a Veneza" e "Votos do Santo" (ambos em Veneza, na biblioteca do Palácio Real) . Finalmente "O Milagre do Escravo" , celebrada obra que é uma das glórias da Academia Veneziana, representando a lenda de um escravo cristão torturado em punição por devoção ao santo e salvo por um milagre.
Estes quatro trabalhos foram recebidos com geral aplauso. Seus tempos de obscuridade terminaram. Era notável o suficiente para casar-se com Faustina de Vescovi, filha de um nobre veneziano. Ela foi uma boa esposa, que aturava seu gênio intratável e lhe deu dois filhos e cinco filhas.
A próxima encomenda foi pintar as paredes e tetos da Escola de São Marcos, obra de enorme esforço e auto-aprendizado para Tintoretto. O prédio foi iniciado em 1525 e era deficiente em iluminação. A pintura começou em 1560, após varios pintores, incluindo Veronese, terem sido consultados. Tintoretto assegurou a obra doando um quadro , "São Rocco recebido no Céu". Completou então a primeira sala. Em 1565 reiniciou os trabalhos com "Crucificação",  "A Praga das Serpentes", "Festividades da Páscoa" e "Moisés Quebrando as Tábuas".
Tintoretto em seguida se lançou na empreitada de decorar a escola adjacente à igreja de São Roque. Descontando alguns detalhes menores, os edifícios contém sessenta e cinco memoráveis pinturas, que podem ser descritas como cenas variadas e sugestivas, adaptadas para serem vistas a meia-luz. "Adão e Eva", "Visitação", "Adoração dos Magos", "O Massacre dos Inocentes", "Agonia no Horto", "Cristo ante Pilatos", "Cristo carregando a Cruz" e "Assunção da Virgem" são as melhores.
Paralelamente Tintoretto começou vários afrescos no Palácio Ducal, "Excomunhão de Barbarrosa" e "Vitória de Lepanto", que foram destruídos no grande incêndio de 1577, além de um retrato do duque Girolamo e várias obras menores.
Agora alcançamos a obra que coroaria o trabalho de Tintoretto, a última pintura de importância que executou, a vasta "Paraíso", considerada a maior pintura jamais feita sobre uma tela, por seu enorme tamanho. É estupenda pela escala, pela pureza da inspiração da alma, com apaixonada imaginação visual e mão mágica para as formas e cores, que desafiou os especialistas por tres séculos. Ele trabalhou na obra em estúdio, levando-a para o local definitivo e dando os retoques finais com a ajuda de seu filho Domenico. Toda Veneza o aplaudiu.
Depois de completar o "Paraíso", Jacopo Robustti tomou uma vida mais descansada, não realizando mais nenhum trabalho relevante, e passou um final de vida tranquilo. Morreu em 1594 de uma doença que começou como uma dor de estômago, seguida de febre. Foi enterrado na igreja da Madona do Horto, ao lado de sua filha Marietta, ela mesma retratista e música, que trabalhou como assistente do pai vestida como um menino. Além dos filhos, teve poucos pupilos, valendo ser citado Martin de Vos. Existem influências de Tintoretto na obra do contemporâneo Veronese  e na do espanhol El Greco, que conheceu sua obra numa viagem a Veneza.

A comparação da "Ultima Ceia" de Tintoretto com a de Leonardo da Vinci dá uma demonstração instrutiva sobre como o estilo artístico moveu-se durante o Renascimento.  A disciplina se irradia de Cristo em simetria matemática. Nas mãos de Tintoretto, o mesmo evento é dramaticamente distorcido, enquanto as figuras humanas são elevadas pela erupção do espírito humano. Pelo dinamismo de sua composição, seu uso dramático da luz e seus efeitos de perspectiva, parece um artista [barroco] antes da hora.
                                                             1549 - St Roch in the Hospital 
 San Rocco, Venice

segunda-feira, novembro 21, 2011

tenho uma grande constipação



Tenho uma grande constipação,
E toda a gente sabe como as grandes constipações
Alteram todo o sistema do universo,
Zangam-nos contra a vida,
E fazem espirrar até à metafísica.
Tenho o dia perdido cheio de me assoar.
Dói-me a cabeça indistintamente.
Triste condição para um poeta menor!
Hoje sou verdadeiramente um poeta menor.
O que fui outrora foi um desejo; partiu-se.

Adeus para sempre, rainha das fadas!
As tuas asas eram de sol, e eu cá vou andando.
Não estarei bem se não me deitar na cama.
Nunca estive bem senão deitando-me no universo.

Excusez un peu... Que grande constipação física!
Preciso de verdade e da aspirina.


Álvaro de Campos, in "Poemas"
Heterónimo de Fernando Pessoa

domingo, novembro 20, 2011

A nostalgia da quimera: o fantástico é o género dominante na literatura portuguesa

A “comunidade” literária portuguesa contemporânea que se dedica à Ficção Científica e ao Fantástico (autores, tradutores, editores, divulgadores), apesar da sua (ainda) reduzida dimensão e (ainda) diminuta visibilidade mediática, tem-se mostrado nos últimos dez anos crescentemente interventiva, pelo menos “intramuros”. Os que a observam mais de perto têm sido testemunhas de regulares – ocasionalmente ácidas mas sempre salutares – controvérsias, discussões, polémicas, em torno de temas como a qualidade, quantidade e diversidade das obras, a sustentabilidade destas (para lá das modas) por parte de um mercado e de um público (mais ou menos) conhecedor e consumidor, ou as estratégias das editoras.
 Existe, porém, outro tema fundamental que acaba, invariavelmente, por constituir como que o “cenário”, o “pano de fundo” de todos os outros: a existência, ou não, de algo que se poderia designar como uma “tradição” -secular, de preferência – do fantástico em Portugal. Eu afirmo que sim, que existe, e vou mesmo mais longe: não tanto pelo número dos seus livros mas mais pelo impacto e influência daqueles, o fantástico assume-se como o género dominante na (história da) literatura portuguesa – muito mais importante do que categorias ou épocas como o iluminismo, romantismo, realismo, modernismo, neo-realismo, pós-modernismo e outros “ismos”.

Encontrei o ponto de partida para esta conclusão numa das muitas iniciativas desenvolvidas por aquele que, pelo seu trabalho enquanto escritor (ficcionista e ensaísta, investigador e divulgador) e cineasta, é hoje incontestavelmente a maior figura de referência do panorama FC & F português: António de Macedo. Que há dez anos dirigiu uma colecção, denominada “Bibliotheca Phantastica”, na já extinta editora Hugin, onde foram editadas obras de autores actuais: Luísa Marques da Silva, Maria de Menezes, Pedro Lúcio, Sérgio Franclim… e eu próprio – “Visões” constituiu a minha estreia literária e ainda o sétimo e último número daquela colecção. Esta, no entanto, incluiu também dois autores “antigos”: João da Rocha com “Memórias de um Médium”, editado originalmente em 1900 mas provavelmente escrito em 1892; e Teófilo Braga com “Contos Fantásticos”, editado originalmente em 1865 (refira-se que o futuro Presidente da República publicaria, em 1905, mais um livro de ficção, “Frei Gil de Santarém”, sobre a lenda do médico, clérigo e santo português da Idade Média que teria assinado um pacto com o Diabo – um antecessor do “Fausto”). Mais: nas introduções que fez aos sete livros, António de Macedo aproveitou para recordar – para muitos de nós, tratou-se mesmo de revelar – obras e autores que podem integrar perfeitamente, graças aos seus romances, novelas e contos, um “quadro de honra” da FC & F portuguesa do século XX – em especial aquela prévia à da geração que se tornaria mais conhecida na viragem dos anos 80 para os anos 90 do século passado, em grande parte graças à “colecção azul” da Editorial Caminho.

Assim, os títulos e os nomes sucederam-se: “Um Jantar Muito Original”, “A Rosa de Seda” e “Czarkresko” (esta incompleta), de Fernando Pessoa; “A Grande Sombra”, “A Estranha Morte do Professor Antena”, “O Fixador de Instantes” (os três incluídos em “Céu de Fogo”) e “A Confissão de Lúcio”, de Mário de Sá-Carneiro; “O Príncipe com Orelhas de Burro” e “Há Mais Mundos”, de José Régio; “Apenas uma Narrativa”, de António Pedro; “As Aventuras de João Sem Medo”, de José Gomes Ferreira; “AK – A Tese e o Axioma”, “Não lhes Faremos a Vontade” e “A Buzina”, de Romeu de Melo; “Contos do Gin-Tonic”, “Novos Contos do Gin” e “Casos do Direito Galáctico”, de Mário-Henrique Leiria; “O Físico Prodigioso”, de Jorge de Sena. Inevitavelmente, António de Macedo também refere José Saramago; na verdade, como não atribuir um significado muito especial ao facto de o (até agora) único Prémio Nobel da Literatura da língua portuguesa ter várias obras – provavelmente, as suas principais – que se podem (e devem) inserir no género fantástico, nomeadamente “Deste Mundo e do Outro”, “O Ano de 1993”, “Objecto Quase”, “Memorial do Convento”, “O Ano da Morte de Ricardo Reis”, “A Jangada de Pedra”, “A Segunda Vida de Francisco de Assis”, “O Evangelho Segundo Jesus Cristo”, “Ensaio Sobre a Cegueira”, “Ensaio Sobre a Lucidez” e “Caim”?

O futuro com história

Todavia, é fundamental salientar que o fantástico na literatura portuguesa é muito anterior ao século XX. Aliás, o realizador de “Os Abismos da Meia Noite” e de “Os Emissários de Khalom” mencionou igualmente dois outros livros – duas colectâneas – que podem dar uma primeira perspectiva do que nesse âmbito se fez para trás. Um é a “Antologia do Conto Fantástico Português” (Afrodite, 1967), com “amostras” dos séculos XX e XIX, editada por Fernando Ribeiro de Mello e com introdução de Ernesto de Melo e Castro – que também está presente enquanto autor, juntamente com, entre os outros 34, Pinheiro Chagas, Álvaro do Carvalhal (com “Os Canibais”, que Manoel de Oliveira adaptou para o cinema), Fialho de Almeida, Teixeira Gomes, Raul Brandão, Aquilino Ribeiro, Almada Negreiros, Ferreira de Castro, Natália Correia e… Ana Hatherly. Esta, curiosamente, é por sua vez a autora/organizadora do segundo livro mencionado acima: “A Experiência do Prodígio: Bases Teóricas e Antologia de Textos Visuais Portugueses dos Séculos XVII e XVIII” (IN-CM, 1983).Temos pois que, para já, existem “registos” de artistas e de obras identificadas como (podendo ser) inseridas no género fantástico até aos anos de 1600. Contudo, deve-se recuar ao século anterior para encontrar a maior obra do fantástico em língua portuguesa… que é, simultaneamente, a maior obra alguma vez escrita em língua portuguesa, e ainda um triplo símbolo – da literatura nesse idioma, da nação que lhe deu origem e da comunidade intercontinental de países, povos e pessoas fundada a partir daquelas. Exactamente: “Os Lusíadas”, de Luís de Camões. Que dúvidas pode haver quanto à classificação de uma obra que inclui na sua galeria de personagens os principais deuses greco-romanos fazendo uso dos seus poderes sobrenaturais, e um gigante monstruoso, titânico (Adamastor), além de a sua acção culminar numa “Ilha dos Amores” imaginária povoada de ninfas acolhedoras? E não esqueçamos, também de Camões, o “Auto dos Anfitriões”, sobre o mito dos amores entre Júpiter e Alcmena e o consequente nascimento de Hércules.

Porém, o nosso maior poeta não está sozinho, na sua época, no seu gosto pelo irreal. De gerações anteriores vêm: João de Barros com a sua “Crónica do Imperador Clarimundo…”, em que, segundo António José Saraiva e Óscar Lopes (na “História da Literatura Portuguesa”), “o maravilhoso céltico de filtros, gigantes, bruxedos, sonhos premonitórios e outros espantos é cuidadosamente harmonizado com o maravilhoso cristão”; Gil Vicente com vários dos seus “Autos” - “dos Reis Magos”, das Barcas (“do Inferno”, “do Purgatório”, “da Glória”) – e também “Cortes de Júpiter” e “Templo de Apolo”, trabalhos cuja natureza dispensa, suponho, explicações e justificações.

Indo mais longe nas profundezas do tempo, chegamos ao que poderíamos designar como o “pai” de toda a narrativa imaginária portuguesa: “Amadis de Gaula”, escrito provavelmente no século XIII por João de Lobeira, talvez trovador durante os reinados de D. Afonso III e de D. Dinis, e cujo protagonista, cavaleiro apaixonado pela princesa Oriana, “se arriscava a combates assombrosos com gigantes ou monstros” (Saraiva e Lopes, idem).

Avançando agora na cronologia, voltemos ao século XVII para irmos ao encontro do (nas palavras de Fernando Pessoa) “Imperador da Língua Portuguesa”. Qual é a obra mais marcante do Padre António Vieira? A “História do Futuro”, explanação e desenvolvimento apaixonado e pormenorizado do seu conceito de “Quinto Império”, uma era, uma civilização, uma sociedade perfeita por vir, em que, sob a liderança de um rei português ressuscitado (primeiro D. Sebastião, depois D. João IV), o Cristianismo se tornaria, enfim, plenamente dominante em todo o Mundo. Por outras palavras: uma das mais espantosas utopias, literárias e não só, de todos os tempos.

Entrando no século XVIII vamos encontrar António José da Silva, que renova o interesse pela mitologia greco-romana em obras como “Os Encantos de Medeia”, “Anfitrião, ou Júpiter e Alcmena” (o mesmo tema quase 200 anos depois de Camões), “Labirinto de Creta”, “As Variedades de Proteu” e “Precipício de Faetonte”. Interesse pelo sobrenatural continuado, quase por “inerência”, nos poetas que constituíram a Arcádia Lusitana, em vários textos de Pedro Correia Garção, Manuel de Figueiredo e Domingos dos Reis Quita… e, na “Nova Arcádia”, e inevitavelmente, em muitos momentos de Manuel Maria du Bocage, pré-romântico que queria “fartar (seu) coração de horrores”. Enfim, assinale-se a existência de um livro intitulado “O Que Há de Ser o Mundo no Ano Três Mil”, de P. J. Suppico de Moraes, editado em 1895, mas cujo autor terá sido contemporâneo de… António José da Silva!
Continuando para o século XIX, verificamos que praticamente todos os grandes escritores portugueses oitocentistas experimentaram, uns mais, outros menos, a fantasia… por vezes luminosa, por vezes sombria. Além dos já referidos acima a propósito da “Antologia…” de Fernando Ribeiro de Mello, são de destacar: Almeida Garrett com “O Retrato de Vénus”; Alexandre Herculano com “A Dama Pé-de-Cabra”, conto incluído em “Lendas e Narrativas”; Camilo Castelo Branco com “O Esqueleto”, “Anátema”, “Os Mistérios de Lisboa e dos Seus Crimes” (recentemente adaptado ao cinema por Raul Ruiz), “A Caveira”, “O Livro Negro de Padre Diniz” e “Coisas Espantosas”; e, claro, Eça de Queiroz… O genial José Maria deu-nos, neste âmbito, um “Dicionário de Milagres” que ficou incompleto. Deu-nos contos como: “S. Cristóvão”, “Santo Onofre”, “S. Frei Gil” (outra abordagem à mesma personagem, prévia à do seu amigo Teófilo Braga) - as “Lendas de Santos”; “Frei Genebro”; “Adão e Eva no Paraíso”; “O Defunto”; “O Suave Milagre”. Os folhetins, crónicas, cartas, que constituem “Prosas Bárbaras”. E, obviamente, o romance (ou novela? Ou conto?) “O Mandarim”.

A fantasia como manto

Na respectiva “carta que deveria ter sido um prefácio” para a edição francesa da obra, Eça de Queiroz, ao tentar explicar o que leva um escritor (que se assume como) naturalista a derivar para a fantasia, acaba talvez por exprimir e sintetizar a atitude de outros escritores nacionais, anteriores e posteriores a ele, perante o mesmo dilema – e, porventura, acaba por revelar a genuína essência, mesmo que (aparentemente) “subterrânea”, de toda a literatura portuguesa.

Assim, “O Mandarim” é apresentado como “uma obra bem modesta e que se aparta consideravelmente da corrente moderna da nossa literatura tornada, nestes últimos anos, analista e experimental; (…) pertence ao sonho e não à realidade, (…) é inventada e não observada, e (…) caracteriza fielmente, parece-me, a tendência mais natural, a mais espontânea do espírito português. (…) Ideias justas, exprimidas de uma forma sóbria, não nos interessam por aí além; o que nos encanta são as emoções excessivas traduzidas com um grande fausto plástico de linguagem. (…) O que nos atrai é a fantasia, sob todas as suas formas, desde a canção até à caricatura; também, na arte, havemos sobretudo produzido líricos e satíricos. Mantivemo-nos de olhos levantados para as estrelas. (…) Somos homens de emoção, não de raciocínio. (…) Entretanto, mesmo antes do naturalismo, já alguns jovens espíritos entre nós haviam compreendido que a literatura de um país não poderia manter-se para sempre estrangeira ao mundo real, que trabalhava e sofria à volta dela. (…) Então impusemo-nos bravamente o dever de não mais olhar o céu… mas a rua. (…) Fazemos esta nobre tarefa não por uma inclinação natural da inteligência mas por um sentimento de dever literário… ia quase dizer de dever público. (…) (Mas se o artista português) não puder por vezes fazer uma escapadela para o azul morrerá bem depressa da nostalgia da quimera. Eis porque, mesmo depois do naturalismo, escrevemos ainda contos fantásticos, dos verdadeiros, daqueles onde há fantasmas e onde se reencontra ao canto das páginas o Diabo, o amigo Diabo, esse delicioso terror da nossa infância católica. Assim, ao menos durante todo um pequeno volume, não sentimos mais a incómoda submissão à verdade, a tortura da análise, a impertinente tirania da realidade. Estamos em plena licença estética. (…)” Apenas três anos mais tarde, Eça de Queiroz como que resumiria o seu pensamento sobre esta matéria a uma só frase notável que colocou como subtítulo de “A Relíquia”: “Sobre a nudez forte da verdade o manto diáfano da fantasia.”

De certo modo, pode-se dizer que, mesmo quando a fantasia não era o género, ou o estilo, maioritário na sua produção literária, vários foram os autores portugueses, em especial os hoje considerados consagrados, que não deixaram de “contribuir para o cânone”, de “picar o ponto”, de “dar o (seu) dízimo” em favor da “causa”. E se equiparássemos a literatura portuguesa ao corpo humano, o fantástico seria a “coluna vertebral” daquela: não é o que ocupa a maior parte da “massa física” mas é o que determina a sua configuração principal, o eixo em volta do qual tudo se relaciona, posiciona e organiza.

Não nos destacámos especialmente no passado por utilizar, e muito menos introduzir, extra-terrestres, super-heróis, vampiros e/ou mutantes, antecipar sociedades futuras e novas tecnologias, descrever viagens inter-planetárias e/ou inter-dimensionais, mas não faltaram autores portugueses que imaginaram e escreveram cenários, situações e personagens fantásticas… nos dois – ou muitos mais – sentidos.

Octávio dos Santos: Jornalista e escritor. Na Ficção Científica & Fantástico é autor de Visões, Espíritos das Luzes e o criador e organizador da antologia colectiva de contos de história alternativa A República Nunca Existiu!; membro da Associação Simetria, desenvolve nesta, desde 2006, o projecto Simetria Sonora, inventário de FC & F na música popular; foi orador nos colóquios Fórum Fantástico (2007 e 2010) e Mensageiros das Estrelas (2010). Venceu em 2009 (no que foi a sua quarta distinção e terceiro triunfo) o Prémio de Jornalismo Sociedade da Informação pelo artigo Humáquinas (versão inicial saída no PÚBLICO) – A ciência e a tecnologia estão a criar novos corpos. Foi o iniciador de um projecto de reconstituição virtual da Ópera do Tejo e da Lisboa Pré-Terramoto de 1755. Traduziu Poemas de Alfred Tennyson.

http://octanas.blogspot.com

sábado, novembro 19, 2011

"Gota de sol" vendida por nove milhões de euros



"Gota de Sol" era a estrela do leilão e estava a gerar grande expectativa porque, há um ano, a Sotheby's vendeu o diamante mais caro de sempre, uma pedra rosada, por 33,4 milhões de euros.
Com um peso de 110,3 quilates, é o maior diamante amarelo em forma de pêra que se conhece, mas esteve perto de não ser vendido no leilão, como foi o caso de outras pedras preciosas.
O preço de venda no martelo foi de oito milhões de euros, somando-se uma taxa de 12% de imposto, ainda por determinar, em função do lugar de residência da pessoa ou instituição que o adquiriu.
A pedra preciosa, descoberta no ano passado numa mina sul-africana, foi valorizada pelos especialistas por oferecer a tonalidade mais rara e desejada para um diamante amarelo.
Por essa razão esteve em exposição durante o primeiro semestre deste ano no Museu de História Natural de Londres.
 in:JN, Lisboa
 

Montanhas como os Alpes sob o gelo da Antárctida

Explicada a origem do complexo montanhoso Gamburtsev
Descoberto em 1958 por uma missão científica soviética, este complexo montanhoso submerso em gelo desafiou até agora explicações científicas. Uma equipa internacional de investigadores, coordenada pela British Antartic Survey, acaba no entanto de explicar a sua génese: tratou-se de um processo longo, que se iniciou há mil milhões de anos e culminou há 34 milhões de anos, com o surgimento da cobertura gelada que preservou aquelas montanhas da erosão natural.
Leia mais pormenores no e-paper do DN

sexta-feira, novembro 18, 2011

de Passos a Oliveira- a responsabilidade será nossa!

Descobertas ruínas de civilização antiga no deserto líbio



Mais de cem cidades fortificadas dos garamante foram identificadas graças a imagens de satélites
Na sua ânsia de expansão, o Império Romano tratou-os como uns nómadas bárbaros e foi essa a imagem que deixou deles. Mas os irredutíveis garamantes tinham afinal uma civilização sofisticada, que estabeleceu uma próspera e complexa rede de cidades e povoados fortificados, entre o século VI a.C e o século VIII da nossa era, onde é hoje território da Líbia. Esta nova visão resulta de um estudo realizado por investigadores britânicos da Universidade de Leicester, que recorreram a imagens de satélite para identificar as antigas cidades fortificadas dos Garamandes nas areias do deserto do Saara. (fonte DN, Lisboa)

quinta-feira, novembro 17, 2011

Portugal na Europa.....


Surge Janeiro frio e pardacento,
Descem da serra os lobos ao povoado;
Assentam-se os fantoches em São Bento
E o Decreto da fome é publicado.

Edita-se a novela do Orçamento;
Cresce a miséria ao povo amordaçado;
Mas os biltres do novo parlamento
Usufruem seis contos de ordenado.

E enquanto à fome o povo se estiola,
Certo santo pupilo de Loyola,
Mistura de judeu e de vilão,

Também faz o pequeno sacrifício
De trinta contos só! por seu ofício
Receber, a bem dele... e da nação.

José Régio

quarta-feira, novembro 16, 2011

O nome parece a infância


O nome parece a infância.
Quando na velhice é termos vindo
Sem pressa

Para dentro
Do nome se esvazia o corpo quando o corpo cai
É um fruto.

O nome é ainda
O modo como chamas.

O nome é a arma contra mim. O maior perigo.
Com os teus lábios podes destruir-me.



Daniel Faria

Vídeo da NASA convida a uma viagem à volta da Terra

A NASA divulgou imagens da Terra, captadas a partir da Estação Espacial Internacional, num vídeo onde se faz uma maravilhosa viagem orbital à volta ao planeta. 

terça-feira, novembro 15, 2011

A troika e o Conde de Lippe

   Duzentos anos depois do  Marquês de Pombal  ter  chamado o Conde de Lippe para reorganizar o Exército português muitos dos  regulamentos por ele elaborados ainda estavam em vigor. Assim , por exemplo, em 1950,  na tropa, as mantas que se punham em cima dos cavalos ainda  eram cuidadosamente  dobradas em conformidade com os seus regulamentos. Estou certo que muitas das normas que a troika nos vai agora obrigar a adoptar, algumas benéficas, vão perdurar durante anos.
    Mas há uma diferença substancial: 
  O Conde de Lippe era um profissional muito experiente e do mais alto  nível que, quando chegou a Portugal, soube ensinar e também aprender.  Assim, quando viu que em Portugal,  que tinha suportado longas guerras com um vizinho mais forte, havia estruturas para mobilizar a população,  nomeadamente, as milícias e as ordenanças, as tropas dos concelhos, não só as conservou como levou a ideia quando regressou ao centro da Europa.
  Os elementos da troika são, certamente, técnicos de elevado nível mas, para além das ideias genéricas que nos trazem,  algumas nem sequer bem testadas no exterior, como é o caso da TSU,  podemos interrogar-nos sobre quais são os conhecimentos e a compreensão que têm da realidade do nosso país.  Eles viram, por exemplo, que em Portugal há freguesias, estruturas que não existem na generalidade dos países da Europa  e propuseram a redução do seu número. Ora, esta redução atinge a qualidade de vida de uma fracção importante da população. Portugal é, com efeito, o país com mais aldeias da Europa. E se 5 km pode não ser  nada para quem anda de automóvel, pode ser  muito para os habitantes de duas aldeias que vejam as suas freguesias fundidas numa só.
  A fusão das freguesias urbanas é um problema muito diferente do das freguesias rurais.  A supressão das juntas de freguesia em muitas aldeias é, de facto, o retirar da cidadania aos seus habitantes.  O processo não deve, portanto, ser decidido a régua e esquadro em gabinetes sem ser precedido de um inquérito às populações e uma muito cuidada avaliação dos benefícios e custos, não só imediatos, mas sobretudo a longo prazo. 
  As aldeias portuguesa, hoje, quase só com idosos, podem, no futuro, com as novas tecnologias, vir a ser locais priviligiados de residência e  trabalho.  Encontrei recentemente uma informática da Nova Zelândia que tinha escolhido para local de trabalho uma aldeia portuguesa.  
  O país da Europa com as estruturas locais mais parecidas com as nossas é, talvez,   a Suiça.  Aconselhar Portugal e fundir freguesias é mais ou menos o mesmo  que dizer  à Suiça que para melhorar o seu sistema financeiro deve alterar as suas estruturas locais.
  Um outro problema que preocupou os elementos da troika foi o da fusão dos concelhos. Mas eles ignoraram uma evolução bastante nítida em Portugal desde há várias décadas. Em todos os distritos, a população dos concelhos onde está a capital tem vindo a aumentar e, na generalidade dos outros, salvo na vizinhança de Lisboa e Porto tem vindo a diminuir.  Para aumentar a população dos concelhos com a população mais elevada não é necessário, portanto, fazer nada.  E agregar os que têm a população a diminuir pode criar situações muito dificeis e conflituosas e,  na maior parte dos casos, só pode contribuir para  diminui ainda mais a sua população .
  Em matéria  de ordenamento do território, a troika tinha um outro assunto com que se preocupar e em que nos podia trazer informações de fora: o da Regionalização, que está na nossa Constituição e hoje é uma realidade  em quase toda a Europa. Para criar riqueza, é em  regiões, e não propriamente em  concelhos com a população um pouco maior, que é preciso pensar.
  E, no que diz respeito à  riqueza, o que será importante para os nossos filhos e netos  é o domínio que terão  sobre as empresas existentes em Portugal. Por outras palavras, a troika deve compreender que, embora o país tenha neste momento um gravíssimo problema financeiro (em que nos está a ajudar) a prazo, o problema fundamental para nós, é o de não entregarmos com privatizações feitas num momento difícil o domínio da Economia do país a entidades estranhas e longínquas, interessadas na rentabilidade dos seus negócios, mas não na qualidade de vida dos nossos filhos e netos.
  Por último, ao olhar  Portugal como um país periférico, a troika está a ter  uma muito estreita visão da Europa.  É  bom   que os seu elementos  se inteirem do que foi dito nos três encontros promovidos na Sociedade de Geografia de Lisboa., em Fevereiro e Março deste ano, sobre o tema: “China, Panamá, Sines. A rota da seda do século XXI ?” Neles tratou-se, fundamentalmente, não das ligações  da China a Portugal, mas das ligações da China à Europa.
  Acontece que o porto de Sines é a melhor porto da Europa para os navios vindos da China e as àreas vizinhas são zonas priviligiadas para implantar indústrias dimensionadas para exportar para metade do mundo,  em particular para a China .    
 
António Brotas
             Professor catedrático jubilado do IST e membro da SGL

domingo, novembro 13, 2011

mensagem do 1º Ministro...

A pose do Governo



 
 
"NÃO SEJA SERVIL; NÃO TENHA SERVOS."
Agostinho da Silva

Dia 09 de Novembro passado. Um compromisso inadiável obrigava-me a estar no Funchal cerca das 15h. Admirei-me de encontrar tantos pequenos/as de mochila às costas, tantas crianças pela mão de adultos. A tarde estava amena, clara de sol e só para os lados do Monte as nuvens pareciam mais carrancudas. Os cafés estavam cheios, homens conversavam pelos passeios e a cidade bulia sem pressas, descontraída.
Tomada de posse do Governo. Sim, e depois? No consultório a televisão transmitia um discurso a que ninguém parecia ligar, ouviam sem ouvir, viam sem ver, como se folheia uma revista em consultório médico!
Tive a chata curiosidade de passar, no dia seguinte, pela oratória. Surpreendeu-me, confesso, o número de identidades estrangeiras nomeadas que, sendo vivas, não sei que grau de lisonja sentiriam. E linha sim, linha não, lá fui tentando dissecar o que de novo pudesse haver na mensagem.
Pela citação de Paulo Krugman e da "necessidade de criar empregos" com o fito certeiro da produtividade digo eu, não me parece que a tolerância de ponto dada a milhares de funcionários fechando escolas e organismos públicos, estivesse na linha de pensamento do mesmo.
E se Santo Agostinho disse que "uma lei injusta é inexistente" também deixou escrito que"…de facto a corrupção é nociva, e se não diminuísse o bem, não seria nociva…"
No Sermão 37 do grande P. António Vieira lemos que "Pior é uma verdade diminuída que uma mentira mui declarada; porque a verdade diminuída na essência é mentira, e tem aparências de verdade; e mentiras que parecem verdades são as piores mentiras de todas." Referir-se-ia, visionariamente, à dívida oculta da Madeira?
Daqui se conclui que este Governo Regional, em tudo igual ao anterior, pecou gravemente contra a sua Pátria, mesmo que ela seja a Madeira, ao fazer uso da verdade oculta.
E, não será a mediocridade que fez a perseguição política, as cenas de "pão e circo" que precedem todas as eleições na Madeira e consequente pseudo inaugurações para um povo vestido com o véu da ignorância política, consumir? Quantas dessas inaugurações estão deficientes, inviáveis, fechadas?
Que renasça uma esperança nova nestes quatro anos. Que se cortem as "gorduras madeirenses" de todas as maneiras, para que não haja denúncias de deputados a residir no Funchal ou bem perto e a receber deslocações, tal como no Governo central, que haja coerência dos que não tiveram a maioria mas ganharam, cumprindo com o prometido, que o arranjinho de lugares simpáticos cesse, que se pense no ónus de um desemprego galopante e de uma Pobreza adivinhada que até pelos passeios da cidade do Funchal será visível.

 Maria Teresa Góis

Assassinando a saudade

Há quanto tempo, amor
não te sentas no sofá
diante do ecrã
para deliciar
os versos meus
que com todo
o carinho
concebi
só para te amar
há quanto tempo, amor
não me espreitas
navegando aqui
contigo
por ti e para ti...
Ah!
Há quem defenda
um desaparecimento
momentâneo
para criar
saudade
e quando esse
instante passa
há um prazer
enorme
em assassinar
a saudade...
Não sei se acredito
nisso,
mas cá estou
assassinando
lentamente
a saudade.

Domi Chirongo

in:Moçambicanto

sexta-feira, novembro 11, 2011

porque é que os funcionários portugueses terão subsídio de Natal e férias cortado?

Omens sem H

Espantam-se? Não se espantem. Lá chegaremos. No Brasil, pelo menos, já se escreve "umidade". Para facilitar? Não parece. A Bahia, felizmente, mantém orgulhosa o seu H (sem o qual seria uma baía qualquer), Itamar Assumpção ainda não perdeu o P e até Adriana Calcanhotto duplicou o T do nome porque fica bonito e porque sim. Isto de tirar e pôr letras não é bem como fazer lego, embora pareça. Há uma poética na grafia que pode estragar-se com demasiadas lavagens a seco. Por exemplo: no Brasil há dois diários que ostentam no título esta antiguidade: Jornal do Commercio. Com duplo M, como o genial Drummond. Datam ambos dos anos 1820 e não actualizaram o nome até hoje. Comércio vem do latim commercium e na primeira vaga simplificadora perdeu, como se sabe, um M. Nivelando por baixo, temendo talvez que o povo ignaro não conseguisse nunca escrever como a minoria culta, a língua portuguesa foi perdendo parte das suas raízes latinas. Outras línguas, obviamente atrasadas, viraram a cara à modernização. É por isso que, hoje em dia, idiomas tão medievais quanto o inglês ou o francês consagram pharmacy e pharmacie (do grego pharmakeia e do latim pharmacïa) em lugar de farmácia; ou commerce em vez de comércio. O português tem andado, assim, satisfeito, a "limpar" acentos e consoantes espúrias. Até à lavagem de 1990, a mais recente, que permite até ao mais analfabeto dos analfabetos escrever sem nenhum medo de errar. Até porque, felicidade suprema, pode errar que ninguém nota. "É positivo para as crianças", diz o iluminado Bechara, uma das inteligências que empunha, feliz, o facho do Acordo Ortográfico. É verdade, as crianças, como ninguém se lembrou delas? O que passarão as pobres crianças inglesas, francesas, holandesas, alemãs, italianas, espanholas, em países onde há tantas consoantes duplas, tremas e hífens? A escrever summer, bibliographie, tappezzería, damnificar, mitteleuropäischen? Já viram o que é ter de escrever Abschnitt für sonnenschirme nas praias em vez de "zona de chapéus de sol"? Por isso é que nesses países com línguas tão complicadas (já para não falar na China, no Japão ou nas Arábias, valha-nos Deus) as crianças sofrem tanto para escrever nas línguas maternas. Portugal, lavador-mor de grafias antigas, dá agora primazia à fonética, pois, disse-o um dia outra das inteligências pró-Acordo, "a oralidade precede a escrita". Se é assim, tirem o H a homem ou a humanidade que não faz falta nenhuma. E escrevam Oliúde quando falarem de cinema. A etimologia foi uma invenção de loucos, tornemo-
nos compulsivamente fonéticos. Mas há mais: sabem que acabou o café-da-manhã? Agora é café da manhã. Pois é, as palavras compostas por justaposição (com hífens) são outro estorvo. Por isso os "acordistas" advogam cor de rosa (sem hífens) em vez de cor-de-rosa. Mas não pensaram, ó míseros, que há rosas de várias cores? Vermelhas? Amarelas? Brancas? Até cu-de-judas deixou, para eles, de ser lugar remoto para ser o cu do próprio Judas, com caixa alta, assim mesmo. Só omens sem H podem ter inventado isto, é garantido.

Por Nuno Pacheco
Jornalista