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"Perdemos a noção das proporções. Ainda há pouco profanavam o nome de Nun'Álvares na pessoa aliás simpática de Paiva Couceiro. Antes disso uns meliantes quaisquer pintaram o nome de Pombal nas democráticas costas de Costa.Os nossos políticos não são gente. Nenhum deles mostra ter tido na sua vida uma daquelas crises espirituais donde se emerge talvez ferido para sempre, mas psiquicamente homem, personalidade espiritual. São ateus pela mesma razão que o é um burro ou uma árvore. São portugueses porque, por desgraça nossa, nasceram adentro da nossa fronteira, oriundos de gente que assim tinha feito. Nenhuma consciência da Raça lhes acende um momento o olhar. São vazios e estúpidos. Só sabem comer e manobrar para comer.
A subserviência, a indisciplina, a desorganização dos homens; a desonestidade, a corrupção, a opressão dos processos governativos; a incúria com que fazem a educação como o fomento, o exército e a marinha como o comércio e a indústria - em que mudaram estas coisas, se não em refinarem, se não porque tudo piorou, pelo menos porque tudo progrediu, e onde o facto é o mal, progredir é piorar. Cada vez mais corruptos, cada vez mais indisciplinados, cada vez mais à mercê do estrangeiro: vendidos ao perigo espanhol por Costa. O facto de esse homem, que em nenhuma outra parte mandaria fora da regedoria ou junta de paróquia que condiz com a sua mentalidade rudimentar, teria a posse dum partido, e, através dele duma pátria. Como é natural, a revolta atingiu o máximo nos adversários. Esta opressão, que todos nós sentimos, esta vergonha de estarmos sendo governados por tendeiros da política, que roubam no peso da própria retórica."
"Carta a um herói estúpido", Ed. Ática, 2010)
"Perdemos a noção das proporções. Ainda há pouco profanavam o nome de Nun'Álvares na pessoa aliás simpática de Paiva Couceiro. Antes disso uns meliantes quaisquer pintaram o nome de Pombal nas democráticas costas de Costa.Os nossos políticos não são gente. Nenhum deles mostra ter tido na sua vida uma daquelas crises espirituais donde se emerge talvez ferido para sempre, mas psiquicamente homem, personalidade espiritual. São ateus pela mesma razão que o é um burro ou uma árvore. São portugueses porque, por desgraça nossa, nasceram adentro da nossa fronteira, oriundos de gente que assim tinha feito. Nenhuma consciência da Raça lhes acende um momento o olhar. São vazios e estúpidos. Só sabem comer e manobrar para comer.
A subserviência, a indisciplina, a desorganização dos homens; a desonestidade, a corrupção, a opressão dos processos governativos; a incúria com que fazem a educação como o fomento, o exército e a marinha como o comércio e a indústria - em que mudaram estas coisas, se não em refinarem, se não porque tudo piorou, pelo menos porque tudo progrediu, e onde o facto é o mal, progredir é piorar. Cada vez mais corruptos, cada vez mais indisciplinados, cada vez mais à mercê do estrangeiro: vendidos ao perigo espanhol por Costa. O facto de esse homem, que em nenhuma outra parte mandaria fora da regedoria ou junta de paróquia que condiz com a sua mentalidade rudimentar, teria a posse dum partido, e, através dele duma pátria. Como é natural, a revolta atingiu o máximo nos adversários. Esta opressão, que todos nós sentimos, esta vergonha de estarmos sendo governados por tendeiros da política, que roubam no peso da própria retórica."
"Carta a um herói estúpido", Ed. Ática, 2010)
Fernando Pessoa
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