“Assim como ser insultado é uma vergonha, insultar é uma honra. Por exemplo, mesmo que a verdade, o direito e a razão estejam do lado do meu adversário, não deixo de insulta-lo; desse modo, todas as suas qualidades passam a ser desconsideradas, e o direito e a honra passam a estar do meu lado.
Ele, pelo contrário, perdeu provisoriamente a sua honra - até conseguir restabelece-la, não mediante direito e razão, mas por tiros e estocadas. Logo, a rudeza é uma qualidade que, no ponto de honra, substitui ou se sobrepõe sobre as outras. O mais rude tem sempre razão: para quê tantas palavras?
Qualquer estupidez, insolência, maldade que alguém possa ter feito, uma rudeza retira-lhes essa característica e elas são de imediato legitimadas. Se, numa discussão ou conversa, outro indivíduo mostra conhecimento mais correcto do assunto, um amor mais austero à verdade, um juízo mais saudável, mais entendimento que nós, ou se em geral exibe méritos intelectuais que nos deixam na sombra, então podemos de imediato suprimir semelhantes superioridades e a nossa própria mesquinhez por elas revelada e sermos, por nosso turno, superiores, tornando-nos ofensivos e rudes.
Pois uma rudeza derrota todo o argumento e eclipsa qualquer espírito; isso se o oponente não tomar parte nela e replicar com outra maior ainda. Não o fazendo, chegamos à vantagem no nobre desafio; desse modo, permanecemos vitoriosos e com a honra do nosso lado.
Verdade, conhecimento, entendimento, inteligência e espírito têm de ser desconsiderados e acabam por ser reprimidos pela divina rudeza. Por conseguinte: as «pessoas de honra», tão logo são confrontadas com uma opinião diferente da sua ou simplesmente com um entendimento mais arguto que pode contradizê-las, preparam-se imediatamente para montar no seu cavalo de batalha, e se, numa controvérsia, lhes faltar um contra-argumento, procurarão uma rudeza, que servirá para o mesmo fim e é mais fácil de encontrar.
Em seguida, vão-se triunfantes. Nesse caso, já se vê o quão é justo dizer, em louvor do princípio da honra, que ele enobrece o tom em sociedade.
ARTHUR SCHOPENHAUER
Texto para reflectir muito devagarinho. Porque se reveste de uma actualidade muito forte e muita sabedoria. Gostei imenso desta reflexão. E com o «poder da vontade», princípio também deste pensador, seguimos adiante valorizando a inteligência, a sabedoria, a bondade e o amor à verdade. Ainda assim considero que com o «poder da vontade», a sociedade se constrói melhor com esses valores do que com a rudeza do insulto, da estupidez e da insolência. A honra está em recusar este caminho com a consciência de que o poderia seguir, mas antes o recusa com honra.
ResponderEliminar