Mesmo correndo o risco de me chamarem vaidoso, devo declarar que sou um cliente de sonho para a Segurança Social. Em 2010 estou a comemorar 30 anos consecutivos de contribuições e continuo no activo. Só estive de baixa uma única vez, quando se revelou que não era apenas no sentido figurado que o meu coração era fraco. E nunca recorri ao subsídio de desemprego, nem ao Rendimento Social de Inserção (RSI). Sou um contribuinte líquido. Estou para o sistema como a Alemanha para a União Europeia.
Infelizmente nem todos são como eu. Há gente tão preguiçosa que, se pudesse, até evitava adormecia só para se poupar ao trabalho de acordar no dia seguinte. Os malandros que usam e abusam da baixa, apesar de estarem de saúde, vivem com a mão metida na carteira de pessoas como eu, ameaçam a sustentabilidade do Sistema de Segurança Social e contribuem, na medida das suas possibilidades, para que as contas públicas fiquem em pior estado que o chapéu de um trolha.
Felizmente, a Segurança Social é um dos sectores em que a coisa pública tem sido gerida com elevadíssimos níveis de eficácia, ao ponto de apresentar sucessivamente excedentes que compensam a quebra das receitas fiscais. Em 2009, o desempenho foi tão bom que o Governo poupou 85,6 milhões na atribuição das prestações sociais, dos quais 16,4 milhões no subsídio de doença, 7,9 milhões no RSI e 60,9 milhões no subsídio de desemprego – uma redução que até me deixa com a boca aberta de espanto, pois trata-se do ano em que o desemprego atingiu os dois dígitos.
A Segurança Social está atenta e vigilante. Aproximadamente 75% das pessoas que estão de baixa há mais de um mês são presentes a uma Junta Médica, que manda cerca de 1/3 delas de volta para o trabalho. E mais de 20 mil acções de fiscalização domiciliária são realizadas anualmente para reduzir o número de pessoas que recebem subsídio indevidamente. À luz desta implacável vigilância, a baixa da antiga apresentadora do Jornal de Sexta da TVI, que dura há mais de cinco meses (muita acima da média, que é de 7,2 dias) é um enorme mistério para mim, que adoptei na juventude fiz a divisa preferida de Karl Marx: de omnibus dubitandum (deve duvidar-se de tudo). Como ela anda para aí a fazer a vida normal, em festas e inaugurações, se desdobra em declarações e até se constitui assistente no processo Face oculta, só há duas hipóteses. Ou não está a ser fiscalizada, como todos os outros “baixistas”, o que é grave. Ou então é mesmo verdade que não anda mesmo bem da cabeça e por isso o melhor é não ligarmos muito às coisas que ela faz e diz.
Esta crónica foi publicada no Diário de Notícias
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