No espectáculo Uma flor para a Madeira, Jardim disse: "Portugal é tão grande, o nosso coração é tão grande." Surpreenda- -se quem queira. Eu acho natural ele dizê-lo. Tal como ele dizer as parvoeiras - como nenhum político português moderno jamais disse - com que enfeitou discursos, invectivas e provocações. Só que, como o outro que nunca traiu a mulher sem fortes motivações lúbricas, nunca Alberto João Jardim atacou sem um ganho para os seus. Os seus: os madeirenses. Haja alguém, neste país, tão preso às gentes, não às ideias para elas. Jardim é um político. A minha definição de político é muito económica: é aquele que gere bens escassos. Só os fartos podem dar-se ao luxo da coerência. "Aquele senhor Pinto de Sousa lá do 'contenente'..." de anteontem era ontem o "sr. primeiro-ministro, nós queremos agradecer--lhe..." E ontem Jardim era sincero, como anteontem Jardim não o era. Ontem, no elogio, eu sei que ele não nos piscou o olho; anteontem, no insulto, quem não estivesse agarrado às ideias feitas saberia ver-lhe a traquinice. De todos os políticos portugueses, todos, nenhum me agradaria conhecer mais. Mas eu não sou ninguém: nenhum político português, desaparecendo bruscamente, deixaria saudades fundas a tanta gente. E não era do líder, era do homem que é líder.
por FERREIRA FERNANDES, DN
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