sexta-feira, maio 22, 2009
Pablo Neruda
Tira-me o pão, se quiseres,
tira-me o ar,
mas não me tires o teu riso.
Não me tires a rosa,
a lança que desfolhas,
a água que de súbito brota da tua alegria,
a repentina onda de prata que em ti nasce.
A minha luta é dura
e regresso com os olhos cansados
às vezes por ver que a terra não muda,
mas ao entrar
teu riso sobe ao céu a procurar-me
e abre-me todas as portas da vida.
Meu amor,
nos momentos mais escuros solta o teu riso
e se de súbito vires que o meu sangue mancha as pedras da rua,
ri,
porque o teu riso será para as minhas mãos
como uma espada fresca.
À beira do mar, no outono,
teu riso deve erguer sua cascata de espuma,
e na primavera, amor,
quero teu riso como a flor que esperava,
a flor azul, a rosa da minha pátria sonora.
Ri-te da noite, do dia, da lua,
ri-te das ruas tortas da ilha,
ri-te deste grosseiro rapaz que te ama,
mas quando abro os olhos e os fecho,
quando meus passos vão,
quando voltam meus passos,
nega-me o pão, o ar, a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso,
porque então morreria.
Pablo Neruda
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