Funerais, missas do sétimo dia? Campanhas eleitorais?
Ou isto foi a metáfora mais esfarrapada de sempre ou MF Leite acha que já é um defunto eleitor.As minhas sinceras condolências!
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Carnival of Cultures 2009 Berlin - Lumix GH1 from Matzeb on Vimeo.
O veto do PR à lei das uniões de facto é o voto pio de quem foi presidente da comissão de honra para a canonização de Nuno Álvares Pereira, de quem acredita que um herói se transforma em colírio para curar o olho esquerdo de D. Guilhermina de Jesus, queimado com óleo de fritar peixe, por intercessão de um guerreiro medieval.
Há argumentos contra a lei das uniões de facto – e referiu-os –, mas não é aceitável a desculpa da oportunidade – e usou-a –, como se coubesse ao PR alterar o período em que se pode legislar.
Se Guterres, com outra dimensão cívica, não foi capaz de resistir aos amigos do peito e da hóstia, na questão do aborto, por que motivo seria capaz este PR, ressentido com a dispensa do pio Conselheiro João Lobo Antunes de uma escusada comissão Ética, de desistir do veto a uma lei que os padres condenam e a Esquerda defende?
A lei vetada, aprovada em Julho com votos contra do PSD, CDS e de três ornamentos pios com que a bancada do PS se matiza, reforçava a protecção jurídica em caso de morte de uma pessoa em situação de união de facto e criava maior protecção do domicílio da família, além do direito à pensão de sobrevivência. Isto é uma abominação para um crente calejado em jejuns e orações.
Aparentemente, Cavaco transformou o PSD e o CDS em instrumentos de uma qualquer ambição política que não augura nada de bom para o País. No PSD tem uma pessoa de confiança sem ideias e, no CDS, um líder com ideias a mais e sem escrúpulos.
O silêncio perante a torpe insinuação do PSD sobre alegadas escutas aos seus assessores contribuiu para o clima de intriga e desconfiança que mina as instituições democráticas, em nítido benefício do partido de que foi líder.
Ao recusar esclarecer o mecanismo e as circunstâncias da compra e venda das acções do BPN, de que beneficiou ele próprio e a filha, Cavaco destruiu a alegada superioridade moral do cavaquismo.
Restava-lhe a isenção e o sentido de Estado. Prefere cuidar da alma e das indulgências. Interpretou bem o desejo dos bispos. É uma opção mas, se continuar a ser oposição à maioria dos eleitores, em sintonia com a direita mais obsoleta, abdica do respeito a que tem direito e da consideração inerente ao exercício do cargo.
«Sou do tamanho do que vejo!» Cada vez que penso esta frase com toda a atenção dos meus nervos, ela me parece mais destinada a reconstruir consteladamente o universo. «Sou do tamanho do que vejo!» Que grande posse mental vai desde o poço das emoções profundas até às altas estrelas que se reflectem nele, e, assim, em certo modo, ali' estão.
E já agora, consciente de saber ver, olhou vasta metafísica objectiva dos céus todos com uma segurança que me dá vontade de morrer cantando. «Sou do tamanho do que vejo!» E o vago luar, inteiramente meu, começa a estragar de vago o azul meio-negro - do horizonte.
Tenho vontade de erguer os braços e gritar coisas de uma selvajaria ignorada, de dizer palavras aos mistérios altos, de afirmar uma nova personalidade larga aos grandes espaços da matéria vazia.
Mas recolho-me e abrando. «Sou do tamanho do que vejo!» E a frase fica-me sendo a-alma inteira, encosto' a ela todas as emoções que sinto, e sobre mim, por dentro, como sobre a cidade por fora, cai a paz indecifrável do luar duro que começa largo com o anoitecer.
in O Livro do Desassossego, Bernardo Soares
É impossível não ver no programa eleitoral do PSD ontem apresentado, e no anúncio pela dra. Ferreira Leite de políticas de firme combate a medidas da dra. Ferreira Leite, a mão maoista (ou o que resta dela) de Pacheco Pereira, a da autocrítica.
Assim, se a chegar ao Governo, a dra. Ferreira Leite extinguirá o pagamento especial por conta que a dra. Ferreira Leite criou em 2001; a primeira-ministra dra. Ferreira Leite alterará o regime do IVA, que a ministra das Finanças dra. Ferreira Leite, em 2002, aumentou de 17 para 19% ; promoverá a motivação e valorização dos funcionários públicos cujos salários a dra. Ferreira Leite congelou em 2003; consolidará efectiva, e não apenas aparentemente, o défice que a dra. Ferreira Leite maquilhou com receitas extraordinárias em 2002, 2003 e 2004; e levará a paz às escolas, onde o desagrado dos alunos com a ministra da Educação dra. Ferreira Leite chegou, em 1994, ao ponto de lhe exibirem os traseiros. No dia anterior, o delfim Paulo Rangel já tinha preparado os portugueses para o que aí vinha: "A política é autónoma da ética e a ética é autónoma da política". (in: JN, Lisboa)
ARRE, que tanto é muito pouco!
Arre, que tanta besta é muito pouca gente!
Arre, que o Portugal que se vê é só isto!
Deixem ver o Portugal que não deixam ver!
Deixem que se veja, que esse é que é Portugal!
Ponto.
Agora começa o Manifesto:
Arre!
Arre!
Oiçam bem:
ARRRRRE!
Ah, onde estou onde passo, ou onde não estou nem passo,
A banalidade devorante das caras de toda a gente!
Ah, a angústia insuportável de gente!
O cansaço inconvertível de ver e ouvir!
(Murmúrio outrora de regatos próprios, de arvoredo meu.)
Queria vomitar o que vi, só da náusea de o ter visto,
Estômago da alma alvorotado de eu ser...
Também não sei (e nunca saberemos, claro), se são verdadeiras ou não as acusações de que assessores de Cavaco Silva participaram na elaboração do misterioso programa eleitoral do PSD. E como não sabemos, vale a mesma regra: é mentira, até prova em contrário (sendo que esta é mais difícil de fazer).
Agora, uma coisa há que é verdade: que Cavaco Silva tem o Palácio cheio de assessores e conselheiros que são militantes ou membros do PSD. Está no seu direito, mas, fazendo-o, sujeita-se às leituras políticas e consequências que daí se podem retirar. Há mesmo um membro do seu staff político que é candidato pelo PSD nestas eleições legislativas. E eu acho que ele lhe devia agradecer os serviços até aqui prestados e dispensá-lo: o Presidente da República, que tem uma obrigação constitucional clara de ser equidistante e independente da luta partidária, não pode albergar dois assessores que são simultaneamente candidatos a deputados pelo maior partido da oposição. Não o fazendo e lançando agora esta guerrilha das supostas escutas, Cavaco vai acentuando cada vez mais a ideia de que não lhe é indiferente o desenrolar do processo eleitoral que aí vem e o seu desfecho. Eu sei que foi José Sócrates que lhe deu o pretexto e a desculpa, com a estúpida guerra do Estatuto dos Açores - uma questão menor e inútil, onde Cavaco tinha toda a razão mas onde Sócrates resolveu desafiá-lo gratuitamente. Mas isso não dá ao Presidente a liberdade de movimentos que ele não tem na querela política que se avizinha.
Belém acaba de dar um passo em falso. Um gigantesco passo em falso. É provável que tenha consequências num futuro próximo, porque há coisas com que não se brinca. E, com tantas outras coisas bem mais importantes para discutir e decidir em Outubro, o país dispensava bem estes acessos de protagonismo a despropósito.
Por uma vez, um aviso a circular na Internet não é produto de uma mente criativa com demasiado tempo livre. Segundo uma fonte oficial da PSP, apesar de não existir um "alerta policial", cruzar uma fotocópia de um Bilhete de Identidade é "uma medida de prevenção que pode ser utilizada pelo comum cidadão". E é absolutamente legal.
Há cópias de BI utlizadas para abrir contas num banco, contrair empréstimos ou adquirir cartões de crédito. O prejuízo é sempre do dono do BI.
In: EXPRESSO, hoje
O cartão está em seu nome e tem agregada a sua morada e provavelmente outros dados pessoais. Mas não é tudo: numa base de dados algures (a incerteza deste algures é relevante) estão listadas todas as compras que você fez sempre que apresentou esse cartão. Ou seja, conta até coisas que você considera privadas.
Se tem a mania da comida saudável, se enche a despensa de comida de plástico ou legumes e produtos dietéticos, se bebe álcool e que tipo de álcool (se é mais amigo das cervejinhas ou do uísque), se usa preservativos ou lubrificantes íntimos, se tem bebés ou crianças a seu cargo, se há lá em casa problemas de incontinência urinária, até mesmo se começou a praticar desporto, se vai de férias ou se fez mudanças em casa. Tudo isso pode ser inferido do seu historial de consumo apenas no supermercado. Os cartões de fidelidade existem também para lhe "tirar a fotografia" e conhecê-lo melhor. Às vezes, bem de mais.
Se está com ideias de deitar fora esse cartãozinho que lhe dava tanto jeito, pense duas vezes. Provavelmente teria que abdicar de inúmeros cartões que traz na carteira: o das Farmácias de Portugal (o seu nome e dados pessoais, mais toda a medicação que compra), os cartões bancários, do seguro de saúde, da bomba de gasolina, do clube de vídeo... Mais os cartões de muitos organismos públicos.
A protecção de dados cruza-se com a privacidade: o direito básico a termos o nosso espaço, livre de intrusão ou da necessidade de dar explicações e a decidirmos que aspectos da nossa vida ficam nesse recato e quais são públicos.
É um direito reconhecido na Declaração dos Direitos do Homem e na Constituição. Não é coisa pouca: é um pilar da dignidade humana e uma condição de liberdade. Apesar disso, é um espaço que está a estreitar-se. Uma das razões é que nos esquecemos de o proteger.
Já lhe aconteceu olhar para os seus movimentos de conta ou para a factura detalhada do telemóvel e sentir a estranheza de estar ali o relato do que foi a sua vida naqueles dias? E se forem outros a ver esse relato?
Texto publicado na edição do Expresso de 22 de Agosto de 2009