Os dias estão estranhos. Temos uma crise anunciada e proclamada há meses, talvez mais de um ano, mas nenhuma cabeça douta que a toma hoje como inevitável a soube antecipar a sério, mais ainda, nenhuma mente iluminada soube apresentar soluções sérias, sem serem as inevitáveis mezinhas do "despeça-se-que-há-gente-a-mais", eles que nunca souberam o que é viver com salários mínimos ou suportar um despedimento que fosse.
Neste entretanto, o PS foi reeleito, para horror dessa gente que duvida sempre da democracia quando esta não lhes dá o resultado desejado (apesar de durante anos nos terem consumido com esse argumento sobre Bush, apesar de eleito sem a maioria dos votos). Neste entretanto, um primeiro-ministro deslumbrado com o poder não soube cuidar do novo poder sem maioria e entreteve-se, vezes demais, a ser provedor dos leitores e espectadores de jornais e televisões, sem se lembrar que não era preciso falar em nome de quem sabe (ou acaba por saber) distinguir o trigo do joio.
O primeiro-ministro também se deixou enredar (ou mergulhou) num mau thriller político com personagens de opereta, sem currículo nem classe. Com Sócrates atascado nesta lama, provocada ou intencional, a oposição resolveu assobiar para o lado, porque não quer ir a votos agora, apenas por razões tácticas, e vai brincando com o nosso dinheiro aprovando mais despesismo para a Madeira superendividada, sem que se perceba como querem o Bloco de Esquerda ou o PCP justificarem tais desmandos no futuro.
De um jorro, estas palavras saem-me descrente da novidade na coisa pública. Há poucos homens em que vale a pena apostar, mesmo apanhados na lide partidária dos dias, como José Manuel Pureza, Edgar Silva, Manuel Alegre e, agora, Fernando Nobre (sim, porque não?). Sou daqueles que crê nos homens e nas mulheres e detesta o maniqueísmo dos argumentos que divide quem está contra ou a favor, sem mais.
Sempre baralhei quem me descobre católico e de esquerda, socialista e defensor da laicidade, como agora - votante de Sócrates em dois actos eleitorais - me assumo crítico o suficiente para exigir que se esclareça tudo. Não porque uns quantos jornalistas acham que podem fazer tudo, em defesa da sua liberdade de dizer, não de uma qualquer ameaça à liberdade de expressão que existe (sim) na precariedade de jornalistas e na concentração de grupos económicos. Sim, é a economia, estúpido. É esta que manda em tudo e que estilhaça à superfície com a política quando se sente ameaçada. É contra senhores como os quatro cavaleiros da SEDES que hoje vomitaram de novo as suas soluções liberais de sempre, sem atender às pessoas, que se deve lutar. Mas com argumentos e prática políticos, não com argumentário gasto e reactivo, à escuta ou à varada.
Miguel Marujo in: Cibertúlia
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