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quinta-feira, novembro 12, 2009

"de que riem os poderosos?"





De que riem os poderosos?
Tão gordos e melosos?
Tão cientes e ociosos?
Tão eternos e onerosos?

Por que riem atrozes
Como olímpicos algozes,
Enfiando em nossos tímpanos
Seus alaridos e vozes?

De que ri o sinistro ministro
Com sua melosa angustia
E gordurosa fala?
Por que tão eufemístico
Exibe um riso político
Com seus números e Levíticos,
Com recursos estatísticos
Fingindo gerar o Génesis,
Mas criando o Apocalipse?

Riem místicos? Ou terrenos?
Riem, com seus mistérios gozosos,
Esses que fraudulentos
Em seus misteres gasosos?

Riem sem dó? Em dó maior?
Ou operísticos gargalham
Aos gritos como gralhas
Até ter dor no peito,
Até dar nó nas tripas
Em desrespeito?
Ah, como esse riso de ogre
Empesteia de enxofre
O desjejum do pobre.

Riem à tripa forra?
Riem só com a boca? Riem sobre a magreza dos súbditos
Famintos de realeza? Riem da entrada
E riem mais
- na sobremesa?

Mas de tanto riem juntos
Por que choram a sós,
Convertendo o eu dos outros
Num cordão de tristes nós?

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Sant’Anna, Affonso Romano, 1937
Poesia reunida: 1965-1999
Porto Alegre, LM&M Pocket - 2004

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