o crescimento das últimas três décadas, muito à conta dos dinheiros da Europa, deu à Madeira tanto de novo e moderno como de decrépito e decadente.
Estou a falar-vos da Madeira. Não vos falo apenas das duas faces da mesma moeda mas dos três lados do mesmo triângulo. A Madeira é um arquipélago maravilhoso, dotado de uma beleza natural estonteante que apaixona aqueles que cá vivem e quem nos visita. O seu relevo e geologia, o mar eternamente presente, as suas espécies e habitats exclusivos e a sua natureza entrelaçada em mais de 5 séculos de ruralidade, fazem da Madeira um recanto de extraordinária beleza. No entanto, neste contexto de um arquipélago favorecido pela natureza, o crescimento das últimas três décadas, muito à conta dos dinheiros da Europa, deu à Madeira tanto de novo e moderno como de decrépito e decadente. Estas duas faces da mesma moeda, a moeda do desenvolvimento (o tal insustentável), marcam hoje parte do nosso território e ameaçam nos próximos tempos, com a crise económica e a falta de recursos, tornar mais visível esse lado obscuro da ocupação desenfreada do nosso litoral, ribeiras e encostas. O modelo extemporâneo de desenvolvimento que se insiste em cravar bem fundo no âmago natural da Madeira, negando a nossa própria identidade e distinção e homogeneizando-nos no meio da globalização, tem um lado positivo que é visto e reconhecido pela maioria dos madeirenses e portossantenses e se traduz na tal face nova e moderna que a Madeira tem vindo a apresentar, à semelhança do que tem acontecido um pouco por todo o país e em muitas partes do mundo. Essa Madeira Nova oferece acessibilidades facilitadas, disponibiliza habitação condigna a uma grande maioria, garante melhores cuidados de saúde, uma educação democratizada e possibilita um maior acesso ao bem-estar, conforto e consumo de bens que há algumas décadas eram simplesmente inacessíveis. No entanto, essa Madeira Nova começa a apresentar rachas nas paredes e tinta descascada, começa a desmoronar e a esboroar-se nas nossas mãos, esvaindo-se por entre os nossos próprios dedos. A construção desta Madeira Nova aconteceu pela força da necessidade primeira de inaugurar de 4 em 4 anos para mostrar obra feita antes das eleições. Não foi devidamente pensada a médio e a longo prazo nem tão pouco no seu funcionamento, operação e manutenção. Os projectos desta Madeira Nova foram delineados para acabar no dia da inauguração, quando na verdade tudo começa nesse momento. Não foi apenas este último temporal que mostrou a fragilidade deste castelo de cartas que é esta Madeira Nova. Quase todos os anos, embora nem sempre se fale nas notícias, esta Madeira construída à pressa e nos locais errados, esfarela-se à evidência de que não compreendeu o nosso território e ignorou o conhecimento transmitido pelos nossos antepassados. O mar e as ribeiras vêm sempre buscar o que é seu e devolvem-nos aquilo que nãos lhes pertence, as terras, os entulhos e o lixo. Já os nossos bisavós sabiam isto. Porquê que os engenheiros e os governantes, e os engenheiros-governantes, não o sabem? A Madeira decrépita começa a alastrar-se em cima da Madeira Nova. São marinas desmanchadas pelo mar, hotéis emperrados a meia construção, estradas em cima de ribeiras mas que "volta e meia" ficam por baixo delas, passeios marítimos fustigados pelo mar e pelas pedras que caem das encostas, teleféricos que enferrujam, estradas ex-libris fechadas, praias de areia amarela devoradas, complexos balneares destroçados e enrocamentos de protecção desmoronados. Um autêntico gigante com pés de barro. Hélder Spínola - Diário Notícias,Funchal |
Aos homens que têm pressa de inaugurar a Natureza lembra-lhes para serem mais sensatos. Qualquer obra a ser executada deve ser bem estruturada a médio e longo prazo e que devem ser feitas sem pressas. Porque a PRESSA É INIMIGA DA PERFEIÇÃO! A ruralidade humana visivel de cinco séculos de história de vida e isolamentos sofridos por todos não deve ser visto como atraso mas como meio de sobrevivencia em que os socalcos por toda a ilha são a prova desta identidade desta ruralidade e deve ser preservada custe o que custar. Conciliar as duas Madeiras de forma equilibrada e segura seria a forma mais sensata para qualquer governante responsável. Custa-nos a assistir a este desenvolvimento"desenfreado" a qualquer preço sem olhar a meios e rebentar esta imagem de beleza, como esta via expresso em S.Vicente tão mal executada e planeada(um exemplo entre tantos que temos de agradecer ás sociedades de desenvolvimento...em muitos casos de "rebentamento" como este!). Se criticamos somos os inimigos da Madeira e somos os maus madeirenses
ResponderEliminarmas que nos custa os olhos da cara lá isso custa, fora as ofensas
sistemáticas à nossa dignidade.
Obrigado por este espaço
F. Alferes