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sexta-feira, novembro 05, 2010

Da Conversa

Há quem, na conversa, prefira mostrar espírito brilhante, e ser capaz de sustentar todos os argumentos, a exercer o juízo no discernimento da verdade, como se houvesse maior mérito em saber o que pode ser dito, do que em conhecer o que deve ser pensado, alguns têm certos lugares comuns e certos temas em que se mostram bons conversadores, mas são falhos na variedade; esta espécie de indigência é quase sempre aborrecida, e de vez em quando ridícula; a parte mais honrosa do colóquio consiste em dar ocasião a novo tema, e também em moderar ou acelerar a transição para assunto diferente; é bom variar, mesclando o assunto de que se está a conversar com argumentos, narrativas com discussões, perguntas com respostas, jocosidades com seriedades; há, porém, assuntos que não permitem brincadeira, nomeadamente a religião, os negócios do Estado, as altas personalidades, todas as questões de importância para as pessoas presentes, enfim, todos os casos dignos de dó.
Aquele que muito interrogar muito aprenderá também, muito contentará também, especialmente se adaptar as suas perguntas aos conhecimentos daqueles que lhe podem responder, pois assim lhes dará ocasião de se comprazerem a falar, e ele próprio continuará a ganhar conhecimentos; se por vezes fingirdes ignorar o que consta que sabeis, para outra vez passareis por saber o que ignorais. Falar acerca de si próprio não é bom que se faça com frequência, e há só um caso em que um homem consegue fazer com graça o seu próprio elogio: é quando louva uma virtude que pretende ter. Discrição na conversa vale muito mais do que eloquência, e mais vale falar singelamente com o interlocutor, do que exprimir-se em palavras cadenciadas e altissonantes. Uma conversa bem conduzida, mas sem uma boa réplica do interlocutor, torna-se muito vagarosa; uma boa réplica que não seja seguida por um bom discurso é de manifesta frivolidade. Usar de muitos circunlóquios antes de abordar o tema é fastidioso; não usar alguns significa demasiada rudeza.
Francis Bacon, in 'Ensaios'

2 comentários:

  1. As conversas, como fazem bem tantas vezes... Mas, outras vezes são fastidiosas porque não nos deixam falar ou porque mais que falemos os ouvidos não escutam. Há uma série de elementos e convergências que implicam este assunto. O segredo é esse, saber dosear quando se fala e se cala, o quanto se fala também me parece importante. Cá vamos andando, mas uma boa conversa, com gente cheia de conteúdo sabe sempre bem. E como pode calhar bem a palavra certa no momento certo.

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  2. Muito pedagógico e muito actual. Devia ser lido por certos "geniais" da nossa praça.

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