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domingo, abril 11, 2010

o ano de 1640 e Fialho

"Como se todos tivessem nascido para destinos de príncipes, o menor contratempo desilude esses inermes (...). À preguiça que lhes deu o clima, juntam o fatalismo sorna que a tradição histórica lhes deu, e a cobardia física, vinda da dependência estrangeira e da esmoplante miséria em que Portugal tem vivido, desde o senhor D. João IV. Nenhum país possui, sob esse ponto de vista, mais autómatos. A iniciativa particular escandaliza a nossa inércia. Qualquer vontade medianamente enérgica nos faz medo E daqui dois males graves. O primeiro é aguardarmos toda a vida, por um fundo sebastiânico da raça, esse protector misterioso que numa manhã de névoa há-de vir pôr-nos a mesa, arranjar-nos o emprego, mobilar-nos a casa, casr-nos rico, e que não vindo nunca, constantemente nos impede de ganhar a vida por um trabalho sólido e higiénico. O segundo é estarmos aptos a sofrer constantemente o jugo dum subalterno audaz que qualquer golpe de mão leve ao pináculo, e que uma vez sagrado chefe, chicoteie a seu gosto a caterva de humildes pulhas que nós somos. Estes dois males ponte-vistam a história de todas as nossas misérias e de todas as nossas subserviências, internas ou externas, quaisquer que sejam (...).
E o que mais confrange é esta abdicação, no Estado como no indivíduo, ser feita de indolência estúpida, de desgoverno insólito, de falta de brio cívico. Não nos cerceia a miséria filha dum estancamento completo de recursos; cerceia-nos o desleixo, derivante dum descaminho de força, e de uma aplicação viciada e de predilecções e faculdades. (...) O resultado é este:em cima, o País gozado por dez ou doze charlatães, de parceria com dez ou doze bandidos, o todo fazendo permutaç~oes d'infâmias e jigajogas de negociatas, que lhes permite aguentarem-se alguns meses mais no tombadilho; em baixo a massa avulsa, morrinhenta, sórdida, sem força, desiludida de tudo, irrespeitosa de tudo, insultando-se como os cães, vendo passar as afrontas indiferente, e deixando-se cair alfim no próprio vómito, onde a letargia a açovaca, té que uma chicotada nova a faça outra vez estrebuchar!
(...)De sorte que o salve-se quem puder não deve exprimir-se no momento actual, por este grito: «quem nos livra dos ingleses!» mas por este outro - quem nos livra de nós mesmos!
In: Os Gatos, 31 de Agosto de 1890

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