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segunda-feira, maio 03, 2010

Cuspir na sopa

fonte: Jornal do Fundão
PENSAVA eu que um Presidente da República devia ter como dever de dignidade defender o país contra afrontas boçais, sobretudo se estas acontecerem à sua frente, em ambiente de pompa e circunstância, no estrangeiro. Um povo elege um Presidente menos para cortar fitas do que para ser intérprete daquele sentimento nacional que, sem ser patrioteiro, coloca como exigência que uma pátria não seja nunca motivo de chacota e humilhação. Ora, o que aconteceu na atribulada visita de Estado de Cavaco Silva à República checa, foi precisamente a diluição dessa responsabilidade presidencial. O Presidente checo, de seu nome Vaclav Klaus, convidou o seu homólogo português para, publicamente, lhe cuspir na malga da sopa que lhe oferecera. Por duas vezes, com inusitada arrogância e sem qualquer propósito diplomático, perguntou se os portugueses não se sentiam nervosos com o défice de 8 por cento, como se este fosse um povo de patetas e os políticos em funções, como o Presidente Cavaco, idiotas chapados. Conheci políticos e Presidentes que não gostavam de levar desaforos para casa. E nunca levaram. Mas Cavaco Silva não esteve à altura do desafio do irrequieto Havel e limitou-se a considerar tudo um jogo de ortodoxia de seu colega checo. Exigia-se firmeza. Há um ditado português que diz: “quem cala, consente!” O Presidente Cavaco Silva meteu a viola no saco. Nem sequer disse ao sujeito que as relações entre Estados não se pautam ao nível da estrebaria, como parece ter sido o caso, e que é de uma deselegância sem precedentes meter o nariz tão ligeiramente em contas alheias. Dos poucos que, na imprensa, reagiram em voz alta, registo a crónica de Baptista-Bastos. E digo como ele: “A viagem a Praga é a arrepiante expressão de um novo género de actuação política e a cartografia de um jornalismo feito de frivolidades, desprovido do magnífico empenho em desvendar o outro lado das coisas”.

Fernando Paulouro Neves, 22.04.10

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